sábado, 23 de maio de 2009


sr fulano de tal...

E os meus dedos saltitam de tecla em tecla, escrevendo o que lhes apetece. É noite e a minha "Chalecazita" parqueada no parque em Viseu e eu aqui, parqueado num quarto junto ao que é realmente mais importante: a familia. Um homem lá vai, deixando um punhado de vida a cada um dos seus filhos, esposas, avós, pais...etc, ele parte deixando um testemunho de vida que se chama saudade... Engraçado, por falar nisso esta semana estivemos a fazer uma "pausula" numa área de serviço perto de Tours. Estava sentado ao volante a olhar para nada e a pensar em tudo ao mesmo tempo, e ouvi algo do genero: -"Pah, só quando vim pa isto, pah, é que me apercebi de como gosto da minha mulher, pah. Tás a ver? Um gajo vem e fica sozinho e quando um gajo de Inverno tem de cozinhar, comer e lavar a louça é que damos valor á mulher...e um gajo matuta nisso e ás vezes até perturba"-e acordei. Eu estava com um colega a ouvir um cd em que o meu mano acaba de participar...em mais um, e falavamos um pouco de tudo enquanto ouviamos o fado como fundo musical...aos poucos lá fui levado para longe e nem sei quanto tempo estive ausente dali, de mim próprio, e foi esta a frase que me despertou. Engraçado, o colega esteve ali a falar e eu não o ouvia...apenas a musica e as guitarras mexiam com os meus sentidos. Sorri, e não sabendo o que lhe dizer sobre aquela sua fantástica descoberta (só notou que gostava da mulher anos depois de estar casado com ela, lol), recordei um médico que esteve na minha companhia em Angola, na Clog6 em Huambo, que um dia me disse que ali, apesar de rodeado de pessoal e logo num cenário onde a agitação dos militares era continua, sentia falta da mulher, da esposa, e que ali teria reforçado o amor que sentia á sua esposa e mãe dos seus filhos. Foi o que depois nas quatro horas seguintes levei em mente. Casos tão distantes mas de contornos semelhantes e conclusão igual. A familia faz-nos falta. Tenho um amigo, também ele se chama Joca que expressa bem nas suas opiniões publicadas em blog, o que realmente é o homem por trás da máquina. Há rasgos de genialidade na forma com se expressa, e eu quando leio e sinto na pele a forma de como é visto o motorista de camião pelos demais utentes da via e não só. Para muitos sou apenas a outra parte do negócio de putedo, para outros o moderno homem das cabines, versão recente do mitico homem das cavernas e ainda para alguns (poucos, felizmente) sou um filho da puta que "só" anda a 90 kms e ando a estorvar a tentativa de recorde da viagem entre ali e acolá. Mas há muito mais do que isso em mim, em homens como eu, mesmo aqueles que mostram em horas de espera de carga em que afundados em tédio parecem querer ser vistos como homens despidos de sentimentos e medos. Quantas horas connosco mesmos, quantas horas de conversa em silencio, falando ás vezes para a "Chalecazita" pedindo para ela aguentar a uma boa velocidade a subir, em situações onde poderemos passar aquele colega que não pode circular a mais que 80...outras vezes ao passar-lhe um toalhete perfumao no tablier falo-lhe...entre uma passa e outra lá vou deixando que a Daf ganhe o seu lugar em mim. Eh pah, andava numa velha Scania que foi tão cumplice de mim, foi o meu antro, o meu lugar movel, casa, companheira de viagem que nunca avariava e a mudança para uma a estrear levou-me a dar uma pequena olhada a sós á cabine da velha companheira, ja sem nada meu e despida dos nossos objectos...a 1ª lampada que fundimos em conjunto, a scania parada com os Pirineus como pano de fundo, tinha nela as pequenas coisas que representavam gigantes recordações de quem me espera ao abrir a porta de casa. A Scania estava despida de nós...mas tive mesmo que me despedir dela e convencer-me que apesar de gostarmos muito do camião que nos foi confiado, ele não passa de uma ferramenta de trabalho, tal como nós, que deve ser udada para trabalhar. Nada de pessoal pois. Já falo com a minha Daf tambem, tem-se portado bem, apesar de estar já com umas cicatrizes que atestam a cumplicidade nossa. Um mercedes que calça a roda, uma lona violentada e um toque meu de traseira (o baptismo é sempre bom pronuncio...sinal que somos nós a colocar-lhes orgulhosamente a primeira medalha). Ouço-a na musica que jorra das suas colunas, ouço-a no seu esforço por me querer agradar, ouço-a devorar quilometros e sinto-a já nas suas expressões agressivas quando dela preciso do seu melhor. É a minha "chalecazita". Dentro de uma cabine ocorrem tambem pensamentos, correm emoções, mantêm-se vivos sentimentos que se carregam sem documentos...dentro de uma cabine decidem-se vidas, choram-se saudades, riem-se alegrias, sofrem-se as dores de quem gostamos...Esta semana eu e a Chaleca iremos até Toulouse e de lá não sabemos para onde, mas iremos. E a viola seguirá tambem porque a triologia assim obriga, e o bilhete é sempre para três...

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