segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Quatrocentos mil...


Peñafiel e o seu castelo ali pousado...

Sr fulano de tal...

Poderia ter gravado a comunicação rádio mas não o fiz embora o momento fosse mais um pedaço de história nossa, meu e da minha 07 sempre fiel, audaz e abnegada. Amanhecemos em Penãfiel, pequena mas próspera localidade logo após Valladolid e segue em direcção* a Sória, o destino era Barcelona para embarcar no ferry e seguir para a ilha Sardenha, Itália. Faltavam exactamente 150 quilómetros de atingir os quatrocentos mil quilometros a bordo da minha Xaleca, veloz e prudente, e o Antunes fazia contas aos seus quilometros e dizia-me:
- Eh pá, vai ser ali 1 km antes da rotunda de Sória. É lá que estaremos quando avançarmos 150 kms.
- Ok, eu vou controlando.

O café de panela feito para 4 ou 5 motoristas sabe sempre bem...assim ao nascer do dia ainda melhor. Olhava o sol nascer e a luz a invadir o Castelo que no alto do povo se ergue. Penafiel tem o Sameiro, Penãfiel um Castelo. O Castelo talvez mais perto do povo do que a igreja...saiba-se lá porquê. Aproveito e tiro uma foto com Peñafiel e a sua sobranceira fortaleza como cenário e arranco.
A viagem decorre bem e em bom ritmo, vou usando o meio rádio disponivel para ir trocando algumas impressões com o Antunes que seguia na frente da expedição. E lá ia ele conferindo e perguntado:
- Faltam 49 kms, certo Queiroz?
- É correcto, tás a trabalhar bem.
- Aí atrás, está tudo bem? pelo retrovisor só vejo dois camiões e somos seis...~
- Ok, vou cá trás e vejo-os todos á frente...a scania nas subidas trasa-se e não o vou passar. Atrás deve vir alguém com rádio. Abranda aí á frente para a malta ter contacto visual
- Ok

E assim se passava a manhã de 30 de Setembro...

E a xaleca deslizava na sinuosa estrada de Sória, troço que sinceramente adoro fazer. Aproxima-se Sória, o Antunes vai fazendo a contagem decrescente pelo rádio e quando o ultimo 9 passou a 0 a buzina tocou e a xaleca percebeu que a festa era dela e foi assim, que registei o momento em que atingi mais um objectivo que agora passa a ser o meio milhão...
- Queiroz, tás ná copia?
- Yeap, Antunes, diz lá...
- Pah...parabens, foi agora, né?
- Certinho, não falhaste. Obrigado. A Xaleca saúda-te...


Quatrocentos mil...o momento


E assim pús uma pequena musica no ar no canal rádio em que estavamos a comunicar e as cornetas das buzinas soaram forte como leão esfomeado por correr por muitos e muitos mais kms.Agora o objectivo será atingir quinhentos mil kms, que sinceramente espero alcançar lá para Junho do ano que vem. Tenho que fazer contas em que dia será mais ou menos, para não aceitar convites de casamento desse dia...
Quatrocentos mil...é muita hora, muitos dias..820 jornadas de trabalho ( o tacógrafo "chiba" tudo), vários Países, dois ou três toques dos quais sei a história...aliás, sei de cor a história de cada escanadela que 33 meses de amadurecimento me ditaram. E gosto que assim seja...saber a história de cada cicatriz que vejo. Acredito que uma viatura tendo um só condutor, fixo, corre o risco sério de trabalhar uns anos mais que algumas viaturas que andam de mão em mão e ironia do destino cada vez mais abandonadas são, até estarem assassinadas de todo e acabem precocemente num parque qualquer sem condições de circular seja para onde fôr. Talvez a xaleca seja o meu reflexo...arranjadinha e tal mas podia estar melhor, mas há muitas que estão bem piores e além disso esta ao meu gosto, mesmo as 5 bruxas e o Pai Natal ao voar a cada curva...e o espanta-espiritos que penduro de noite para que o vento a abanar a cabine o agite, serenamente, de forma a soar suave até onde durmo. A jovem xaleca é o meu canto quando não estou em casa. Tenho de ter tudo o que possa precisar...e viola essa não pode faltar, acho que não sei ir para lado nenhum sem que pense que me pode apetecer tocar um pouco de viola para mim. Papel e lápis para desenhar também não, livros para ler e papel para escrever. Quatrocentos mil quilómetros tão distribuídos por euforia, alegria, tristeza, saudade, ira e ás vezes raiva. Mas em suma quase todas consumidas aqui, a 2 , eu e a almofada. Histórias de viagens, avarias, avanços, travessias e travessuras...que acabei a comemorar no navio "Cruise Barcelona" com os colegas que partilharam comigo o destino e o fim-de-semana.


Esqª para dta: Antunes, Armando, Queiroz, Jorge Amaral, José e o Slva.

E aquele ponto, a iniciar a subida ligeira para a rotunda de Sória fica assim intrisecamente ligado a este momento e sempre que lá passarmos, será como passar o local onde fizemos os 300 mil...tocamos se fôr de dia ou dá-mos piscas se fôr de noite porque de facto há locais e momentos que não se esquecem. Embora vamos a outros 100 mil...assim Deus queira e o patrão deixe. Assim seja...amén.


* Já vos disse o que acho do acordo ortográfico? Acho que já o escrevi aqui num qualquer post recesso colocado aí há meses mas em suma...não vou muito com moderniçes, para ser educado até diria que quero que o acordo ortográfico nunca me siga o rasto.