sexta-feira, 17 de maio de 2013

Voltamos a ser estranhos

Sr fulano de tal...

 
  Voltámos a ser estranhos...sento-me deste lado do teclado e vejo apenas esta página em branco a desfilar despida diante os meus olhos e não sei...não sei o que escrever. É estranho voltar a escrever de novo as palavras que podem ser lidas pelo mais comum dos olhos, é estranho sentir de novo os dedos a bailar como que tontos em cima destas teclas queimadas da cinza que vai caíndo do cigarro. Não sei sequer se lembro a password de entrada na "caminete07" mas escrevo como se nunca a houvesse esquecido. As viagens foram acontecendo, os quilometros passaram todos sob as rodas e a Xica permanece aqui, mais cúmplice do que nunca a rasgar pacientemente todos as rotas e destinos sempre com enorme sentido do dever...é uma extensão de mim vista assim de cá de dentro e lida com os olhos com que a vejo. Não me é estranha...só me é estranho o que de novo encontro para lá do para-brisas e das janelas que jorram luz durante o dia. Fecho-as á noite...a Xica deixa de ser a máquina e passa a ser lar, doce lar da lenga-lenga, e eu deixo de ser o motorista e passo a inquilino fechado no seu cubículo por não lhe ser estranho. Antes(lá está o tal antes), ficavamos na eternidade apenas na memória de quem nos conhecia...hoje, se morrer, vão ficar para aqui estas coisas minhas imateriais mas que não morrem...caiem aqui e andam aí...perdidas no mundo num qualquer megabyte pendurado num satelite. Depois vem um vírus e...mas ficam aí, perdidas. Nâo morremos aqui e por isso vou encher bem o megabyte pendurado.
   O frio tolda-me os sentidos neste final de Abril, a neve bate-me á porta e eu pergunto-me o que mais falta fazer ao mundo para que ele seja diferente do antes, que pessoas não conformadas com o presente sempre evocam. Lembrei durante alguns minutos a minha infância. Chuva de Inverno, sol e chuva na Primavera e sol no Verão...o Outono era roubar castanhas dos castanheiros, com frio e nevoeiro tanto desinteressava. Havia o dia em que de cima do guarda-vestidos saía a minha mala de roupa de verão. Era a autorização maternal de andar de calções e t-shirt. Naquele tempo a minha mãe mandava vestir um casaco e eu vestia... Abrir essa mala era sentir o cheiro suave que um qualquer sabonete libertara silenciosamente por entre as delicadas roupas de menino. Era o adeus ás camisolas de gola alta em lã, camisolas que "picavam" o pescoço, o fim das ceroulas, o fim das calças de tecido grosso. De novo o sabonete iria ser encerrado na mala com a roupa de Inverno e eram assim os dias antes. Hoje não se sabe. O tempo anda estranho e lembrar que caí na asneira de vir preparado para jornadas de calor que justificam o calção e a meia-manga e apanho neve. É estranho nevar a 27 de Abril.
   Voltámos a ser estranhos...ou eu vou concebendo ou apenas descubrindo um mundo que desconhecia. Um mundo despovoado, vazio, de pensamentos e silencio feitos, de voz muda e rir apenas nos Lol ou nos smiles dos chats. E é neste mundo que tenho descoberto momentos singulares e pessoas tão despidas de interesse que nem sequer a minha suspeiçao levantavam. E se não eramos estranhos, então que o voltemos a ser. Não faz mal.


Sugestão musical: http://www.youtube.com/watch?v=Ld3ZKU0wUSw