terça-feira, 2 de julho de 2013

Sexta-feira 13

 Sr fulano de tal...

   Há algo no decorrer do dia que me deixa a sensação de vazio interior que por tanto dilatar quase me sinto um balão prestes a cair na ponta de um pequeno espinho... Como se preenchem os dias em que nada nos enriquece? Que não encontro algo que me faça sorrir, ter qualquer manifestação exuberante ao sol para me rir da textura do meu corpo numa calçada, num pouco de espiche, numa parede... Há dias assim.
   O céu acaba de ser esventrado pelo nascer do novo sol de sempre, já não acredito nos despertadores para que me despertem a horas em que há azul dourado no céu. Deixo frestas nas cortinas para que a luz invada o meu espaço pela manhã. Abro os olhos devagar...acordo sempre bem disposto e de pazes feitas com o dia anterior. Despacho-me cedo e lembro as imagens de 4 cães de raça a atacarem violentamente um jovem touro indefeso numa arena. Não me surpreenderia nada se fosse em qualquer parte do globo, mas...em Portugal? Não, gostamos é de futebol,tremoços e cerveja fresca ou um bom vinho com elas a acompanhar. Cada região tem as suas culturas enraízadas e intrisecas delas mesmas, mas pensar que a nossa cultura caminha para cenas como esta? Não, redondamente não. Mas desta vez, o neo-acto cultural tem um nome, um responsável. Chama-se artisticamente João Moura Junior...filho do afamado cavaleiro tauromático João Moura. A não ser Viana do Castelo e talvez a Povoa do Varzim, o norte é quase despido da tradição tauromática. Eu respeito as tradições de cada região, nem a favor nem contra...mas crueldades desta natureza? Lembrar que há cerca de um ano este jovem viu o seu cavalo amigo morrer repentinamente numa praça durante uma lide. A pena que tive do rapaz perante a morte do seu amigo animal...Agora dou com esse desperta penas a treinar cães pastores a atacarem vitelos indefesos.
   Muito se tem escrito e dito sobre os cães de raça. Um cão rapidamente aprende o que o dono necessita que ele aprenda. Por isso vemos as valências várias dos cães que são tantas que vão do atacar touros a salvar vidas. Tudo depende do treino e da educação a que se induz o cão. Tem mérito o tratador que treina o seu cão a farejar vida sob escombros? Sim. Tem mérito um tratador que ensina o seu cão a detectar explosivos? Sim. Terá mérito a pessoa que treinou estes cães a atacar em matilha um animal que tem por destino uma arena, a morte com banda e palmas, directos na tv e a possibilidade de marrar um grupo de forcados? Não. Não tem e é repugnante. Filho de uma estrela, de um idolo de muitos aspirantes a cavaleiro.
   Ando parte do despertar a pensar nisso e só quando sinto que os meus dedos acabam de atar os atacadores dos ténnis percebo que estou pronto para sair de mim e do que me invade. Inquieta-me e nem percebo porquê?
   O dia foi-se desenrolando e o sol cruzou sobre mim em céu absolutamente azul e profundo. Mas nada me devolvia o meu ánimo de sexta-feira...13. Só agora me recordo que foi sexta 13...e só agora entendo que o azar me levou a faltar ao concerto ás 22 horas. Tudo transbordava de cor e brilho...os primeiros dias de sol e azul sabem tão bem. Em cada sombra após almoço se vê um convite a uma pequena refexão numa perspectiva horizontal e nem isso me anima. Há dias em que tudo corre mal e a sexta-feira 13 parece diferente de outras sextas-feiras iguais com lugar reservado noutro numero do calendário. Não ligo a supertições e apesar do gato preto e de ter passado debaixo da escada, cá estou...com sorte de estar vivo.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Voltamos a ser estranhos

Sr fulano de tal...

 
  Voltámos a ser estranhos...sento-me deste lado do teclado e vejo apenas esta página em branco a desfilar despida diante os meus olhos e não sei...não sei o que escrever. É estranho voltar a escrever de novo as palavras que podem ser lidas pelo mais comum dos olhos, é estranho sentir de novo os dedos a bailar como que tontos em cima destas teclas queimadas da cinza que vai caíndo do cigarro. Não sei sequer se lembro a password de entrada na "caminete07" mas escrevo como se nunca a houvesse esquecido. As viagens foram acontecendo, os quilometros passaram todos sob as rodas e a Xica permanece aqui, mais cúmplice do que nunca a rasgar pacientemente todos as rotas e destinos sempre com enorme sentido do dever...é uma extensão de mim vista assim de cá de dentro e lida com os olhos com que a vejo. Não me é estranha...só me é estranho o que de novo encontro para lá do para-brisas e das janelas que jorram luz durante o dia. Fecho-as á noite...a Xica deixa de ser a máquina e passa a ser lar, doce lar da lenga-lenga, e eu deixo de ser o motorista e passo a inquilino fechado no seu cubículo por não lhe ser estranho. Antes(lá está o tal antes), ficavamos na eternidade apenas na memória de quem nos conhecia...hoje, se morrer, vão ficar para aqui estas coisas minhas imateriais mas que não morrem...caiem aqui e andam aí...perdidas no mundo num qualquer megabyte pendurado num satelite. Depois vem um vírus e...mas ficam aí, perdidas. Nâo morremos aqui e por isso vou encher bem o megabyte pendurado.
   O frio tolda-me os sentidos neste final de Abril, a neve bate-me á porta e eu pergunto-me o que mais falta fazer ao mundo para que ele seja diferente do antes, que pessoas não conformadas com o presente sempre evocam. Lembrei durante alguns minutos a minha infância. Chuva de Inverno, sol e chuva na Primavera e sol no Verão...o Outono era roubar castanhas dos castanheiros, com frio e nevoeiro tanto desinteressava. Havia o dia em que de cima do guarda-vestidos saía a minha mala de roupa de verão. Era a autorização maternal de andar de calções e t-shirt. Naquele tempo a minha mãe mandava vestir um casaco e eu vestia... Abrir essa mala era sentir o cheiro suave que um qualquer sabonete libertara silenciosamente por entre as delicadas roupas de menino. Era o adeus ás camisolas de gola alta em lã, camisolas que "picavam" o pescoço, o fim das ceroulas, o fim das calças de tecido grosso. De novo o sabonete iria ser encerrado na mala com a roupa de Inverno e eram assim os dias antes. Hoje não se sabe. O tempo anda estranho e lembrar que caí na asneira de vir preparado para jornadas de calor que justificam o calção e a meia-manga e apanho neve. É estranho nevar a 27 de Abril.
   Voltámos a ser estranhos...ou eu vou concebendo ou apenas descubrindo um mundo que desconhecia. Um mundo despovoado, vazio, de pensamentos e silencio feitos, de voz muda e rir apenas nos Lol ou nos smiles dos chats. E é neste mundo que tenho descoberto momentos singulares e pessoas tão despidas de interesse que nem sequer a minha suspeiçao levantavam. E se não eramos estranhos, então que o voltemos a ser. Não faz mal.


Sugestão musical: http://www.youtube.com/watch?v=Ld3ZKU0wUSw